por ELISABETH ROSENTHAL, no New York Times, em 02/05/2009
Lave suas mãos.
Eu sei que parece bobagem, mas é muito mais eficaz para prevenir a gripe do que ter uma dose de Tamiflu no armário do banheiro. Aceite a sugestão desta médica, mãe e repórter que cobriu a SARS assim como a gripe aviária, onde elas foram mais virulentas.
Em 2003, quando a SARS se espalhava pela Ásia, eu trabalhava em Beijing. Muitas famílias fugiram. A escola das minhas crianças -- a Escola Internacional de Beijing -- foi uma das poucas da cidade a ficar aberta, embora a classe de minha filha tenha caído de 25 para menos de 10 alunos.
Para as crianças que ficaram, a escola instituiu políticas estritas -- aquelas que as escolas promovem o tempo todo mas nunca cobram. Para os pais, a primeira era: Não mande seu filho doente à escola. Para os estudantes, era: Lave as mãos frequentemente durante todo o dia -- antes das refeições, depois do recreio.
Ninguém pegou SARS. Mas mais que isso, os vírus de estômago e as gripes comuns, que são um problema em escolas primárias de todo mundo, também desapareceram.
Se lavar as mãos é a primeira lição da epidemia de SARS a ser aplicada na gripe suína, as outras são: Máscaras, símbolos de proteção, raramente são úteis. E aproveite para ficar fora de casa; é onde você NÃO vai pegar a gripe.
Odeio ver imagens de pessoas no México andando de bicicleta ou caminhando nas ruas de máscaras. As doenças infecciosas não são transmitidas bem ao ar livre e sob o sol. Como médica e repórter, minha regra principal é entrevistar pessoas com infecções respiratórias -- da gripe comum à tuberculose ou gripe aviária -- em espaços abertos. Isso às vezes significa o saguão aberto de um hospital. Sim, evite multidões em espaços fechados de lugares onde possa haver perigo.
Também evite tocar coisas que muita gente toca -- maçanetas e escadas rolantes, por exemplo -- e em seguida tocar o nariz ou a boca. Tendo trabalhado em uma sala de cirurgia, já me acostumei a evitar isso.
Máscaras são para quando você não pode evitar espaços fechados em uma epidemia séria -- quando, por exemplo, você precisa viajar em um ônibus ou no metrô lotado. Em 2003 eu tinha uma máscara em minha bolsa enquanto viajava por cidades fortemente afetadas na Ásia, mas só usei raramente. Quando transmite uma doença infecciosa pelo ar, um paciente geralmente espirra ou tosse. No auge da SARS na China, se um passageiro por perto exibia sintomas, eu procurava outro lugar no metrô ou no avião.
Posso dizer da minha experiência em Beijing que ter uma cidade inteira de mascarados é devastador para o tecido social. É difícil ter uma conversação através de uma máscara -- não dá para ver os sorrisos ou a decepção. Uma boa máscara, usada com propriedade, é desconfortável e dificulta a respiração. E vestir uma máscara em volta do pescoço é mais um amuleto contra a doença que uma forma cientificamente válida de proteção.
Num ano normal nos Estados Unidos, milhares de pessoas morrem de complicações de gripe. A morte de um bebê no Texas ou as 200 pessoas que sucumbiram no México são casos trágicos, mas não preocupantes numericamente. Podem sugerir até que esse tipo de gripe suína é bem leve. Não temos idéia de quantas pessoas pegaram essa gripe e tiveram sintomas leves -- presumivelmente um grande número -- e passaram batido pelo sistema público de saúde. Mais informação é necessária para descobrir.
O que explica porque autoridades de saúde estão investigando os casos e seguindo a epidemia para saber qual o seu destino. É a melhor forma de evitar algo pior e ajudar a sociedade a se preparar. Mas assistí-los fazendo seu trabalho deveria nos dar segurança, não causar pânico.
Mesmo com a SARS, que teve uma alta taxa de mortalidade (1.000 pessoas morreram de cerca de 8 mil infectados) você pode argumentar que as consequências mais profundas foram econômicas. Gente em pânico cancelou reuniões e viagens em toda a região até meses depois, devastando as economias locais.
Falta de informação, assim como excesso, pode ser perigoso.
Em 2003, a China criou pânico ao tentar encobrir a epidemia de SARS, negando que ela tivesse atingido Beijing. O vácuo de boas informações levou a rumores selvagens. O perigo estava em todo lugar e em nenhum lugar. Pessoas deixaram a cidade por meses e ficaram distantes por não se saber se o risco era grande ou pequeno. Eu me lembro de vilas no campo implantando programas para descobrir a SARS. Moradores paravam o seu automóvel e enfiavam o termômetro na boca ou atrás da orelha para descobrir se você estava infectado.
Uma grande forma de espalhar o que quer que houvesse de doença.
Com a gripe suína, ainda bem, estamos no modo de divulgação total. Temos estatísticas a cada minuto. Mas as pessoas devem entender exatamente a informação que recebem. Pandemias em potencial rendem grandes manchetes; cientistas trabalhando duro, não. Pessoas vestindo máscaras dão grandes fotografias, mas a escola de Queens onde os alunos vão voltar às aulas, não.
Como médica, estudante de saúde pública e mesmo como jornalista, eu tremo quando ouço referência ao vírus suíno, ou H1N1, como "vírus mortal". As provas até agora não sugerem que seja mais mortal que o vírus da gripe comum. E há essa sentença que tenho lido frequentemente: "A Organização Mundial da Saúde não declarou uma pandemia, ainda". A sentença seria normal -- retratando a informação existente sem presumir o que virá -- se não incluísse o "ainda" final.
Jornalista, radialista, professor e escritor de histórias infantis, mas, acima de tudo, um viciado em informação.
Com experiência em TV (Ceará e Cidade de Fortaleza - Record), não dispensamos cantarolar de vez em quando.
Pra não dizer que fugimos do mundo da intelectualidade, temos Especialização em Gestão da Comunicação nas Organizações pela UFC. Fizemos parte da equipe do Prêmio ESSO sobre Furto ao BC do O POVO. Também temos prêmio em Radiojornalismo pela Associação Cearense de Imprensa.
Um comentário:
Gripe Suína: Não cultive o pânico
por ELISABETH ROSENTHAL, no New York Times, em 02/05/2009
Lave suas mãos.
Eu sei que parece bobagem, mas é muito mais eficaz para prevenir a gripe do que ter uma dose de Tamiflu no armário do banheiro. Aceite a sugestão desta médica, mãe e repórter que cobriu a SARS assim como a gripe aviária, onde elas foram mais virulentas.
Em 2003, quando a SARS se espalhava pela Ásia, eu trabalhava em Beijing. Muitas famílias fugiram. A escola das minhas crianças -- a Escola Internacional de Beijing -- foi uma das poucas da cidade a ficar aberta, embora a classe de minha filha tenha caído de 25 para menos de 10 alunos.
Para as crianças que ficaram, a escola instituiu políticas estritas -- aquelas que as escolas promovem o tempo todo mas nunca cobram. Para os pais, a primeira era: Não mande seu filho doente à escola. Para os estudantes, era: Lave as mãos frequentemente durante todo o dia -- antes das refeições, depois do recreio.
Ninguém pegou SARS. Mas mais que isso, os vírus de estômago e as gripes comuns, que são um problema em escolas primárias de todo mundo, também desapareceram.
Se lavar as mãos é a primeira lição da epidemia de SARS a ser aplicada na gripe suína, as outras são: Máscaras, símbolos de proteção, raramente são úteis. E aproveite para ficar fora de casa; é onde você NÃO vai pegar a gripe.
Odeio ver imagens de pessoas no México andando de bicicleta ou caminhando nas ruas de máscaras. As doenças infecciosas não são transmitidas bem ao ar livre e sob o sol. Como médica e repórter, minha regra principal é entrevistar pessoas com infecções respiratórias -- da gripe comum à tuberculose ou gripe aviária -- em espaços abertos. Isso às vezes significa o saguão aberto de um hospital. Sim, evite multidões em espaços fechados de lugares onde possa haver perigo.
Também evite tocar coisas que muita gente toca -- maçanetas e escadas rolantes, por exemplo -- e em seguida tocar o nariz ou a boca. Tendo trabalhado em uma sala de cirurgia, já me acostumei a evitar isso.
Máscaras são para quando você não pode evitar espaços fechados em uma epidemia séria -- quando, por exemplo, você precisa viajar em um ônibus ou no metrô lotado. Em 2003 eu tinha uma máscara em minha bolsa enquanto viajava por cidades fortemente afetadas na Ásia, mas só usei raramente. Quando transmite uma doença infecciosa pelo ar, um paciente geralmente espirra ou tosse. No auge da SARS na China, se um passageiro por perto exibia sintomas, eu procurava outro lugar no metrô ou no avião.
Posso dizer da minha experiência em Beijing que ter uma cidade inteira de mascarados é devastador para o tecido social. É difícil ter uma conversação através de uma máscara -- não dá para ver os sorrisos ou a decepção. Uma boa máscara, usada com propriedade, é desconfortável e dificulta a respiração. E vestir uma máscara em volta do pescoço é mais um amuleto contra a doença que uma forma cientificamente válida de proteção.
Num ano normal nos Estados Unidos, milhares de pessoas morrem de complicações de gripe. A morte de um bebê no Texas ou as 200 pessoas que sucumbiram no México são casos trágicos, mas não preocupantes numericamente. Podem sugerir até que esse tipo de gripe suína é bem leve. Não temos idéia de quantas pessoas pegaram essa gripe e tiveram sintomas leves -- presumivelmente um grande número -- e passaram batido pelo sistema público de saúde. Mais informação é necessária para descobrir.
O que explica porque autoridades de saúde estão investigando os casos e seguindo a epidemia para saber qual o seu destino. É a melhor forma de evitar algo pior e ajudar a sociedade a se preparar. Mas assistí-los fazendo seu trabalho deveria nos dar segurança, não causar pânico.
Mesmo com a SARS, que teve uma alta taxa de mortalidade (1.000 pessoas morreram de cerca de 8 mil infectados) você pode argumentar que as consequências mais profundas foram econômicas. Gente em pânico cancelou reuniões e viagens em toda a região até meses depois, devastando as economias locais.
Falta de informação, assim como excesso, pode ser perigoso.
Em 2003, a China criou pânico ao tentar encobrir a epidemia de SARS, negando que ela tivesse atingido Beijing. O vácuo de boas informações levou a rumores selvagens. O perigo estava em todo lugar e em nenhum lugar. Pessoas deixaram a cidade por meses e ficaram distantes por não se saber se o risco era grande ou pequeno. Eu me lembro de vilas no campo implantando programas para descobrir a SARS. Moradores paravam o seu automóvel e enfiavam o termômetro na boca ou atrás da orelha para descobrir se você estava infectado.
Uma grande forma de espalhar o que quer que houvesse de doença.
Com a gripe suína, ainda bem, estamos no modo de divulgação total. Temos estatísticas a cada minuto. Mas as pessoas devem entender exatamente a informação que recebem. Pandemias em potencial rendem grandes manchetes; cientistas trabalhando duro, não. Pessoas vestindo máscaras dão grandes fotografias, mas a escola de Queens onde os alunos vão voltar às aulas, não.
Como médica, estudante de saúde pública e mesmo como jornalista, eu tremo quando ouço referência ao vírus suíno, ou H1N1, como "vírus mortal". As provas até agora não sugerem que seja mais mortal que o vírus da gripe comum. E há essa sentença que tenho lido frequentemente: "A Organização Mundial da Saúde não declarou uma pandemia, ainda". A sentença seria normal -- retratando a informação existente sem presumir o que virá -- se não incluísse o "ainda" final.
Postar um comentário